Entidades alertam para contaminação da água por agrotóxicos

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A contaminação por agrotóxicos da água ofertada para o consumo da população nas cidades catarinenses foi tema de audiência pública da Comissão de Turismo e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, realizada na noite desta segunda-feira, 30. O debate reuniu, no plenarinho do Parlamento, entidades que atuam no controle do uso de agrotóxicos em Santa Catarina, representantes do governo estadual, do Ministério Público e da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

O proponente da audiência foi o deputado Padre Pedro Baldissera (PT), que preside o Fórum Parlamentar para a Preservação do Aquífero Guarani e das Águas Superficiais. O parlamentar informou que o debate foi solicitado por várias entidades ligadas ao monitoramento da contaminação da água usada para o consumo, especialmente após a divulgação de estudos realizados pelo Ministério Público Estadual, constatando a presença de resíduos de agrotóxicos nas águas que chegam às torneiras de municípios catarinenses.

“A água é um elemento fundamental para a vida humana. Temos uma série de contaminação de diversos tipos e níveis na água consumida e que são prejudiciais à saúde humana e animal. A verdade é que não há um empenho do poder público em aprofundar pesquisas, avaliações e estudos para levantar com precisão o real nível de contaminação das nossas águas. Não só as superficiais, hoje temos indícios da contaminação das águas subterrâneas”, afirmou Baldissera.

O estudo do Programa Qualidade da Água, do MPSC, foi apresentado pela professora da UFSC e presidente do Fórum Catarinense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos (FCCIAT), Sônia Hess. A análise encontrou a presença de agrotóxicos em mananciais que abastecem a população em 60 municípios catarinenses, dos 175 analisados. Nas amostras coletadas, os níveis estavam bem acima do que é tolerado na União Europeia, por exemplo. Os índices, no entanto, estavam dentro do que é permitido pela legislação brasileira. Em algumas das amostras, inclusive, foi encontrada a presença das substâncias atrazina e simazina, que estão banidas desde 2004 nos países europeus, devido aos efeitos prejudiciais à saúde.

“Nós estamos morrendo envenenados. Santa Catarina está entre os estados com maiores índices de morte por câncer e por suicídio. O câncer é uma doença proveniente do envenenamento. E, em grande parte, os suicídios têm a ver sim com envenenamento. E eu estou falando de água envenenada por agrotóxico”, alertou a professora.

Representando a secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca, o engenheiro agrônomo da Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de SC (Cidasc), Mário Álvaro Aluísio Veríssimo, alegou que o debate é complexo. Segundo ele, o mesmo produto que é taxado como veneno, é classificado também como insumo agropecuário.

“Do ponto de vista da amplitude que esses produtos têm para a nossa economia e para as atividades do meio rural, a discussão sobre uso, regulamentação, consumo, prescrição, armazenamento e comércio desses insumos possui um arcabouço legal amplo no nosso país, desde a legislação federal, que trata do registro das moléculas e fórmulas, até normas estaduais, como a Lei 11.069/1998, que regula em Santa Catarina a produção, comércio, armazenamento e transporte desses produtos”.

Normas mais rígidas

O Coordenador do Centro de Apoio Operacional do Consumidor (CCO) do MPSC, promotor de Justiça Eduardo Paladino, adiantou que a partir do segundo semestre deste ano, o órgão vai monitorar o abastecimento de água de todos os 295 municípios catarinenses. O principal desafio atualmente, segundo ele, é trabalhar uma regulamentação própria para Santa Catarina mais rígida do que é praticado hoje.

“Se levarmos em conta as circunstâncias atuais, a nossa água é considerada potável. Apenas 40 moléculas são monitoradas semestralmente, das mais de 500 que existem. Nós admitimos cinco mil vezes mais volume de glifosato na nossa água do que os países da União Europeia aceitam. Não tenho dúvidas de que precisamos avançar muito para criar uma regulamentação que evite um impacto maior dos agrotóxicos na vida das pessoas”, defendeu Paladino.

Grupo de trabalho

Como encaminhamento do debate, foi criado um grupo de trabalho composto por representantes das entidades que participaram da audiência pública com o propósito de aprofundar as demandas levantadas. A primeira reunião do grupo está marcada para a hoje, 08, na Assembleia Legislativa.

Estudo apontou que águas de Porto União estão contaminadas

O estudo apresentado no “Seminário sobre Agrotóxicos nos Alimentos, na Água e na Saúde”, realizado pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) em 2019, apontou a presença de agrotóxicos na água de abastecimento público de 100 municípios de Santa Catarina e identificou que 22 recebem água com resquícios de agrotóxicos. Ao todo foram analisados 204 princípios ativos de agrotóxicos. As operadoras do sistema de água pesquisam somente 27 substâncias, conforme o parâmetro indicado pelo Ministério da Saúde.

Dos 17 princípios ativos de agrotóxicos encontrados na água que chega aos municípios monitorados, sete são proibidos na União Européia devido aos efeitos negativos que podem provocar na saúde humana – atrazina, simazina, bromopropilato, metalacloro, permetrina, propargite, propiconazol. Entre os municípios está Porto União, que é abastecido pela água do Rio Iguaçu pela empresa paranaense Sanepar, assim como União da Vitória.

As amostras foram coletadas entre março e novembro de 2018, período de safras e cultivos, pelo Programa da Qualidade da Água Tratada, do Centro de Apoio Operacional do Consumidor (CCO) do MPSC, em parceria com a Agência Reguladora Intermunicipal de Saneamento (Aris) e a Agência de Regulação de Serviços Públicos de Santa Catarina (Aresc). O monitoramento é realizado com recursos do Fundo para Reconstituição de Bens Lesados (FRBL).

Para a Coordenadora do CCO, Promotora de Justiça Greicia Malheiros da Rosa Souza, o resultado das análises aponta a necessidade de ampliação do monitoramento e a realização de pesquisa para identificação da origem de contaminação e adoção de medidas corretivas para diminuir os riscos ao cidadão. (Fonte: MP de Santa Catarina).

Na água em Porto União foram encontrados Atrazina (usado em plantações de milho, cana-de-açúcar, pinus e sorgo para o controle de ervas daninhas) e Diurom (usado em plantações de abacaxi, alfafa, algodão, banana, cacau, café, cana-de-açúcar, citros, eucalipto, seringueira, soja, milho, trigo e uva).

No início do ano de 2000, o então vereador e agrônomo de União da Vitória Anesio da Cunha Marques questionou as informações sobre a água fornecida pela Sanepar para a população de União da Vitória e Porto União.

“Procuro ser claro que não afirmo que existe contaminação na água da Sanepar, mas sim de que as análises que a Sanepar realiza não são suficientes para garantir a qualidade da água frente aos agrotóxicos que são utilizados na bacia de captação. Assim, existe a dúvida e a grande probabilidade de possuir resíduos de agrotóxicos que não são objetos de análise pela Sanepar”, disse na época ao Jornal O Iguassú em uma das tantas entrevistas dadas por Anesio ao diário. Quase duas décadas depois o Ministério Público de Santa Catarina comprovou o questionamento de Anésio.

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