O impacto ambiental provocado por intervenções em áreas de preservação da cidade de Bonito (MS) foi discutido nesta terça-feira (21), em audiência pública conjunta das comissões de Meio Ambiente (CMA), Agricultura e Reforma Agrária (CRA) e Desenvolvimento Regional e Turismo (CDR).
Considerado um polo do ecoturismo mundial, Bonito é o principal município do complexo turístico do Parque Nacional da Serra da Bodoquena, tendo recebido mais de 200 mil visitantes em 2018, conforme relatório anual do Observatório do Turismo e Eventos de Bonito (OTEB). Reportagem do programa Fantástico, exibida em 7 de abril pela TV Globo, no entanto, mostrou que as águas cristalinas do lugar estão sendo inundadas por lama. Ambientalistas denunciaram que o problema tem sido causado por plantios, ocupações irregulares e construções de estradas em áreas de preservação.
Um dos autores do requerimento para realização da audiência pública, o senador Nelsinho Trad (PSD-MS) disse que o objetivo da discussão é atrair a atenção dos órgãos competentes, para que Bonito seja tratado com o cuidado que merece “um patrimônio da humanidade”. Já o presidente da CMA, senador Fabiano Contarato (Rede-ES), ressaltou que a intenção do debate é compreender a competência de cada um dos atores e alertar para o momento que o Brasil vive no aspecto ambiental.
Representante do Instituto de Desenvolvimento de Bonito e da Associação de Atrativos Turísticos de Bonito e Região, Guilherme Poli disse que, desde 2017, eventos climáticos têm ocasionado chuvas concentradas na região, o que sobrecarrega o meio ambiente e maltrata os rios. Segundo Poli, a abertura do solo para criação do gado e a expansão urbana desordenada, que ajudam a levar sedimentos aos córregos, são outras questões, de intervenção humana, que precisam de atenção especial do poder público.
— Nós não temos recursos, e precisamos deles. Precisamos urgentemente terminar a [rodovia] MS-382, cuja obra está parada e também está ajudando a carrear sedimentos para o rio — denunciou.
Debate
O superintendente de Ciência e Tecnologia, Produção e Agricultura Familiar de Mato Grosso do Sul, Rogério Beretta, declarou que o desenvolvimento de qualquer área provoca desequilíbrios. Mas pontuou que o Decreto estadual 15.197, de 21 de março de 2019, disciplina os projetos técnicos de manejo e conservação de solo e água para atividades que demandem ações de mecanização nas bacias de contribuição do Rio da Prata e do Rio Formoso, nos municípios de Jardim e Bonito.
Segundo Beretta, essa medida tem o objetivo de preservar a integridade do solo e dos recursos hídricos naquela região, além de reduzir o impacto dos sedimentos que correm para esses rios e córregos, principalmente no período de chuvas, a fim de evitar prejuízos ao meio ambiente e às atividades econômicas, em especial ao turismo.
— Nós entendemos que, em termos de reserva legal, Bonito está muito bem atendida. Temos um entendimento muito técnico de que mesmo aumentando áreas de manejo para 100 ou 150 metros, não vamos impedir o turvamento das águas, devido aos sedimentos que correm em velocidade, e essa é uma questão de fácil comprovação — explicou.
Presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso do Sul (Famasul), Maurício Saito disse que não é o produtor rural quem causa turbidez nos rios. Segundo ele, há problemas pontuais em cada segmento do setor produtivo que ainda precisam ser conhecidos e apontadas as possíveis responsabilidades.
Saito comentou a preocupação sobre as condições de Bonito para sustentar o aumento do fluxo turístico local e defendeu que, além de investir em sistemas de produção e melhorias de saneamento, o Poder Público deve buscar alternativas viáveis para a manutenção de todos os sistemas envolvidos nesse processo.
— Consideramos a necessidade de sensibilização e de uma atuação efetiva da Câmara e do Senado Federal na tentativa de resolução desses problemas pontuais. Também nos colocamos à disposição para trabalhar no compartilhamento das informações, para que o produtor possa adotar as tecnologias necessárias dentro de suas propriedades.
O secretário de Turismo de Bonito, Augusto Barbosa Mariano, ressaltou que lixo e água são os dois maiores desafios do século 21, especialmente em Bonito. Ele informou que 2 mil hectares foram desmatados no município nos últimos sete anos, e que, atualmente, há 1.496 hectares em situação crítica de recuperação. De acordo com o secretário, o aumento da fronteira agrícola é outro problema significativo, embora já exista legislação específica e restritiva neste sentido.
— Nós temos o dever mínimo, como cidadãos, de entregar para gerações futuras um meio ambiente e uma natureza melhores do que recebemos das gerações passadas. Porque não as recebemos de herança de nossos pais, mas as pegamos emprestadas de nossos netos.
Parcerias
O diretor de Criação e Manejo de Unidades de Conservação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade Brasileira (ICMBio), do Ministério do Meio Ambiente, Marcos de Castro Simanovic, disse que o órgão é parceiro na busca pelo equilíbrio na utilização dos recursos naturais. Ele afirmou que não se trata de um assunto simples, mas defendeu o cumprimento da legislação, especialmente no que tange às ações de recuperação das áreas manejadas. Simanovic afirmou que a sociedade é o principal fiscalizador de possíveis crimes ambientais e que, embora as causas dos problemas registrados em Bonito sejam diversificadas, há alternativas técnicas e legislativas para resolver todas as questões.
— Estamos falando de um interesse comum, porque todas as pessoas querem a sustentabilidade, a proteção e a conservação do que está lá. A recuperação precisa ocorrer de maneira adequada e a criação de unidades de conservação também deve ser bem estudada.
Pedro Alves Corrêa Neto, da Secretaria de Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, declarou que o maior desafio do setor, que envolve atividades turísticas, de agronegócio e de logística, consiste em achar o equilíbrio entre o perfil produtivo e a conservação dos recursos naturais. O especialista considerou que a agricultura brasileira avança de forma rápida e dinâmica na busca desse equilíbrio e frisou que o discurso da proteção ambiental está presente no dia a dia do produtor rural.
— Afinal, o patrimônio dele é a terra, são os recursos naturais, porque é dali que ele tira o seu sustento e promove a oferta de alimentos para toda a população.
Diretora do Departamento de Desenvolvimento Produtivo do Ministério do Turismo, Larissa Rodrigues Peixoto, disse que o ministério reconhece a importância de Bonito como polo turístico. Ela informou que, desde a criação da pasta, foram investidos cerca de R$ 15 milhões em obras de infraestrutura na região e afirmou que o governo atua de acordo com as necessidades locais, sempre com apoio da prefeitura.
— A gente ainda não tem dados que revelam queda significativa [do turismo] causada pelos problemas ambientais, mas estamos cientes de que isso pode acontecer em breve. Entendemos ser importante essa discussão, inclusive, junto à área da agricultura, ao município, à população local, para que possamos entender os entraves e, assim, atuar de forma integrada e cooperada.
Interatividade
Diversos internautas do Mato Grosso do Sul expressaram sua opinião, por meio do Portal e-Cidadania. José Sabino disse que as águas dos rios revelam problemas generalizados. Ele defendeu a recuperação das margens dos ribeirões e pediu divulgação do assunto.
Yolanda Prantl Mangieri afirmou que, por se tratar de um município diferente, Bonito precisa de leis próprias, com vistas à sua proteção. Para Marla Diniz Brandao Dias, toda cidade tem problema, mas Bonito precisa “urgentemente de um olhar mais cuidadoso e direcionado”. Pedro Hardt Araujo ponderou que, após o licenciamento, com adequação às medidas para sustentabilidade, se fazem necessárias a fiscalização e providências “à altura das possíveis irregularidades”.
Source: Senado