Vamos falar de juros, de novo….

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Vamos falar de juros, de novo….

A política monetária no Brasil é frequentemente discutida nos meios econômicos e financeiros, especialmente em tempos de alta inflação ou dificuldades econômicas. Um tema central nessas discussões é a taxa Selic, que é utilizada pelo Banco Central para influenciar o comportamento da economia. Mas como exatamente a Selic, a meta para essa taxa, os juros de longo prazo e o custo do crédito interagem entre si? E por que forçar a queda dos juros via meta da Selic pode ser uma estratégia ineficaz?

O que é a meta da taxa Selic?

A meta da taxa Selic é aquela definida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil. É dela que ouvimos falar quando o presidente reclama que os juros estão altos por culpa do banco central. Porém ela representa, apenas, o objetivo que a autoridade monetária estabelece para a taxa básica de juros da economia, não é de fato a taxa selic. O intuito dessa meta é influenciar o nível geral dos juros na economia e, consequentemente, controlar a inflação. O Copom ajusta a meta da Selic com base em suas expectativas sobre a inflação futura e a atividade econômica. Se a inflação estiver alta, o Banco Central pode aumentar a meta da Selic para conter o consumo e o crédito, o que ajuda a reduzir a pressão sobre os preços.

Então o que é a taxa Selic de fato?

A taxa Selic propriamente dita é a taxa de juros efetivamente praticada no mercado para operações de curtíssimo prazo lastreadas em títulos públicos federais. Essa taxa também é utilizada como indexador de diversos investimentos, e formas de crédito ou financiamento. Ela flutua diariamente, mas tende a seguir a meta estabelecida pelo Copom. Esse mecanismo de ajuste ocorre por meio de operações de mercado aberto conduzidas pelo Banco Central, onde os bancos e o tesouro nacional compram ou vendem títulos públicos para manter a taxa próxima da meta.

Juros de Longo Prazo

Os juros de longo prazo refletem as expectativas do mercado em relação à economia no futuro. Eles são influenciados não apenas pela taxa Selic, mas também por fatores como o risco fiscal, a percepção de inflação futura, a credibilidade das políticas econômicas e as condições internacionais. Enquanto a Selic influencia o custo do dinheiro no curto prazo, os juros de longo prazo capturam as incertezas e riscos que o país enfrenta em horizontes mais amplos.

Quando o governo tem uma política fiscal descontrolada ou há incerteza sobre o futuro da economia, os investidores exigem prêmios maiores (juros) para emprestar dinheiro por prazos mais longos, o que eleva os juros de longo prazo. Portanto, mesmo que a Selic esteja baixa, se os juros de longo prazo continuarem altos, os financiamentos de longo prazo, como imobiliário e investimentos empresariais, permanecem caros.

O custo do crédito no Brasil

O custo do crédito é o quanto as empresas e consumidores pagam para obter empréstimos e financiamentos. No Brasil, ele tende a ser significativamente mais alto do que em outros países, devido a uma combinação de fatores. Além da taxa Selic, outros componentes como spread bancário (a diferença entre o que os bancos pagam para captar recursos e o que cobram ao conceder crédito), risco de inadimplência, impostos, e custos operacionais influenciam o valor final pago pelo tomador de crédito.

Por que a meta da Selic não basta para reduzir os juros?

É comum ouvir o clamor por uma redução da meta da Selic como forma de forçar a queda dos juros. No entanto, essa medida isolada é ineficaz por vários motivos:

  1. Expectativas do mercado: A queda da meta da Selic pode ser vista com ceticismo se os agentes econômicos não acreditarem na sustentabilidade da política fiscal. Se houver incertezas sobre o controle da inflação no futuro, os investidores exigirão taxas de juros mais altas em prazos mais longos, mantendo elevado o custo do crédito para empresas e consumidores.
  2. Risco país: O risco fiscal e a percepção de instabilidade econômica podem aumentar os juros de longo prazo. Mesmo que a Selic caia, se o governo não demonstrar comprometimento com políticas fiscais sólidas, os investidores irão precificar um prêmio de risco adicional, mantendo os juros de longo prazo elevados.
  3. Inércia inflacionária: Em muitos casos, a inflação está enraizada em expectativas e contratos de longo prazo. Reduzir a meta da Selic artificialmente pode aumentar a inflação futura se os agentes econômicos interpretarem a medida como sinal de relaxamento no combate à inflação. Com isso, os juros de longo prazo podem subir, em vez de cair.
  4. Spread bancário elevado: No Brasil, o spread bancário é alto devido a fatores como inadimplência, regulação, e a própria estrutura do sistema bancário. Assim, mesmo que a Selic seja reduzida, o custo do crédito pode não cair proporcionalmente, pois os bancos mantêm margens elevadas para compensar os riscos de crédito e operacionais.

No fim das contas

Reduzir a meta da Selic pode ser uma ferramenta útil em determinadas condições econômicas, mas forçar a queda dos juros apenas por meio dessa política sem uma base sólida — como controle da dívida pública, melhora na confiança do mercado e na eficiência do sistema financeiro — é ineficaz. O custo do crédito e os juros de longo prazo são fortemente influenciados por fatores como risco fiscal, expectativas inflacionárias e a eficiência do sistema financeiro. Portanto, uma abordagem ampla, que combine política monetária responsável, controle fiscal e reformas estruturais, é essencial para reduzir o custo de financiamento de forma sustentável no Brasil.

 

Mateus H. Passero
Assessor de investimentos
4traderinvest.com.br
41 9 9890 9119

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