Os impactos da pandemia na religião

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A livre associação religiosa foi um direito conquistado por diversos grupos no Brasil em 1934, tendo assim o direito de se reunir em culto religioso garantido por lei. Todavia, com a pandemia do coronavírus, está sendo necessário alterar a forma convencional de celebrar a fé em conjunto, e para entendermos como os cidadãos do Vale do Iguaçu contornaram esse obstáculo, conversamos com alguns líderes religiosos.

           O Padre da Catedral do Sagrado Coração de Jesus, da Diocese de União da Vitória, Silvano Surmacz, descreveu a trajetória da Igreja e como a evangelização evoluiu com os meios de comunicação, “Hoje a internet se tornou fundamental para a Igreja. Cada tempo tem suas peculiaridades, por exemplo, na origem da igreja a palavra era transmitido pelos homens, pelos evangelhos escritos. Depois, durante muitos séculos, poucos tinham acesso à palavra de Deus escrita. Com a imprensa, no ano 1454, a palavra de Deus vai se popularizar e a Igreja também vai se adaptar. Com o Vaticano II, um grande concílio ecumênico no início da década de 1960, se recomendou que todas as famílias católicas tivessem a palavra de Deus, para a estudar, compreender e viver. Nesse momento começou muito a se usar rádio e missas televisivas e também  outros meios de comunicação, como jornais e revistas, que já vem antes da Primeira Guerra Mundial, e também através de boletins paroquiais. Com o advento da internet, nós nos adaptamos e a vemos como um grande instrumento de evangelização”, contou.

            Para a benzedeira Maria Salete Gavasso, “a maior diferença notada foi a rotina na vida de todos, já que o isolamento social afetou e cancelou varias comemorações”, relatou. Já Juarez de Lara, do Lar Espírita União, relata que a maior dificuldade foi o distanciamento, “estamos sentindo todas as limitações assim como a maioria das pessoas estão sentindo. Consideramos o Lar Espirita uma extensão da família, o contato com as pessoas faz muita falta, tanto com os voluntários das tarefas assim como o público”. Ele completou dizendo que “a falta da troca de afeto faz muita falta, pois somos seres sociais precisamos de amor e contato com os semelhantes”, segundo Juarez.

            A forma adotada pela maioria dos entrevistados para dar continuidade às atividades religiosas em meio ao distanciamento foi a internet. O Pastor Daniel Carvalho da Primeira Igreja Batista de União da Vitória, que adotou as plataformas do Facebook e no YouTube para transmissão de cultos online, contou que “a internet tem sido fundamental para nossas transmissões. Dessa forma podemos transmitir cultos onde os membros podem ficar em casa, mais tranquilos”, disse. Lara destacou a eficiência do Lar Espírita ao cancelar as atividades mesmo antes do decreto, para preservar a saúde dos participantes e completou que “a internet tem auxiliado muito em substituição as tarefas presenciais do centro espírita, foram adotados os aplicativos de reuniões para continuidade de estudos, tarefas e algumas ações como de assistência e promoção social”, diz.

            A transição para cultos online, apesar de difícil, foi produtiva segundos os entrevistados. O Pastor Daniel revelou que “antes da pandemia, com cultos e programação semanal alcançávamos 300 pessoas por semana. Agora alcançamos em torno de 5000 pessoas”, exemplificando o aumento do alcance proporcionado pela internet. O Padre Silvano relatou que o mesmo fenômeno aconteceu na Catedral, “normalmente, na Igreja Catedral, cabem em torno de 350, 400 pessoas no máximo, e nós chegamos a ter 1,2 mil visualizações nas transmissões que fizemos devido à pandemia”. Segundo Juarez, do Centro Espírita União, a participação diminuiu “pois o público que busca a casa, em sua grande, parte prefere as reuniões e estudos presenciais. Mas com a priorização do uso das mídias sociais temos visto grande crescimento do público”, contou.

            A plataforma para transmissão mais citada pelos entrevistados é o Facebook, por ser de fácil acesso e vasta utilização, como contou o Padre Silvano Surmacz, “usamos o Facebook por ser uma plataforma mais popular”. Mauro Bedaque, diretor de parcerias de entretenimento do Facebook na América Latina, contou a revista Exame, que “Desde o lançamento do Facebook Live, já vimos mais de 8,5 bilhões de transmissões ao vivo”, e esse número ainda sofreu um aumento exponencial em meio à pandemia. Outra plataforma muito utilizada para fins de transmissões religiosas é o YouTube. Nessa plataforma, o canal da Primeira Igreja Batista de União da Vitória, que transmite lives de celebrações semanais, já conta com mais de 1,2 mil inscritos, e cerca de 143 mil visualizações em todo seu conteúdo. Canais de igrejas maiores, como o da Primeira Igreja Batista de Curitiba, contam com números ainda mais surpreendentes: 75 mil inscritos e 12 milhões de visualizações, em seus mais de 3 mil vídeos e transmissões no canal. A Catedral Sagrado Coração de Jesus registrou 7 mil visualizações e 30 mil interações em seu evento da Missa de celebração da Semana Santa transmitido pelo Facebook, exemplificando o aumento do alcance das celebrações à distância.

            Em relação às expectativas para normalização, a bendezeira Salete Gavasso disse crer que “tudo voltará ao normal no tempo de Deus”, segundo ela. Já o Pastor Daniel Carvalho disse que surgirá um novo conceito do que é normal, “Será impossível voltar como era. Tudo será um novo normal. Tivemos que repensar nossa forma de encarar o mundo. Aqueles que conseguirem compreender terão uma nova visão do que realmente é importante, onde estão os verdadeiros valores: Deus e Família”, relata.  O presidente do Centro Espírita União, destaca as mudanças que ocorrerão na percepção das pessoas, “as mudanças no nosso entendimento foram necessárias justamente para promover muitas reflexões em nossos modelos de vida social e com certeza algumas irão perdurar, como o maior cuidado com a saúde e também o maior uso das mídias”, afirmou. O Padre Silvano Surmacz acredita que “mudanças acontecem ao longo da história, e do meu ponto de vista, as pessoas irão procurar a Igreja com um novo modo de rezar e crer, com uma fé muito mais intensa. Agora, as pessoas perceberam que sem a espiritualidade existe um desequilíbrio. Nunca se viveu tantas mentiras, tantas fake news, nunca se negou tanto a ciência, fé, religião e Deus. Isso pode parecer negativo, mas faz as pessoas refletirem”, disse.

Na Igreja do Padre Silvano, a normalização começou a engatinhar, “Nas últimas semanas, houve uma flexibilização. Para entrarmos nas normativas da secretaria de saúde, colocamos cadeiras de plástico com 1,5m de espaçamento, fiéis que são de risco são recomendados a não participarem presencialmente, fazemos apenas uma missa por dia, sempre com uma higienização após o término, álcool em gel e máscara na entrada e na saída. Foi a forma que encontramos para voltar”, relatou.

Sobre as lições que podemos aprender em meio à situação de pandemia a benzedeira afirmou que “a pandemia nos mostrou o valor de estarmos juntos, o peso de um abraço, a vontade de estar pertinho. E quando tudo isso passar o valor de tudo isso, será ainda maior”, segundo ela. Para Lara, “este momento, segundo a doutrina espirita, é mesmo para refletirmos e tirarmos as melhores lições, como ela mesmo nos diz: nada é por acaso! Sempre vamos aprender principalmente com as dificuldades, o momento é de transição, e a confiança e esperança sempre devem estar conosco! A doutrina dos espíritos nos ensina que Deus é a causa primária de todas as coisas e que é justo e bom!”, relatou. Já o Padre Silvano disse que “as pessoas que tem fé e tentam compreender o que é praticamente incompreensível se saem mais fortes, se tornam mais sensíveis para o sofrimento, fome, pobreza e caridade. Penso que agora a humanidade começou a se voltar para os pobres, que estavam sendo esquecidos. Uma nova humanidade vai surgir, com certeza, e pessoalmente acredito que ela será melhor”, relatou. Para o Pastor Daniel, “é na força e na coletividade que podemos superar as grandes crises, como essa que enfrentamos. Isoladamente, ninguém consegue superar essa situação, há uma necessidade de juntar todas as forças para combater e superar a situação. Todos os profissionais são importantes para a manutenção de uma sociedade e para vencer uma situação difícil como essa. Precisamos manter nosso corpo, alma e espírito equilibrados para enfrentar os problemas”, afirmou.

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