A denúncia profética do Papa Francisco (I)

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Daniel Andrés Baez Brizueña*

A denúncia profética e corajosa do pontificado do Papa Francisco não é fácil de sintetizar. Já que o pensamento filosófico, teológico e político do pontífice sobre economia e direitos humanos fundamentais estão em continuo diálogo e perpassa em todos os temas. É verdade, que, Jorge Mario Vergoglio não é um teólogo de profissão, ele é um pastor-pastoralista, homem que fala a linguagem do povo e dos pobres. A vivencia de Francisco no esta alicerçada na intelectualidade e sim na prática, no abraço, na acolhida, no calor humano.

O Papa possui a plena consciência e sabe que seus piores inimigos não são as pessoas que pensam diferentes, e, sim, são os católicos “conservadores e puritanos” que ficam idealizando um passado moralista que em nome da tradição matam as iniciativas positivas do anuncio do evangelho. Os cristãos que se denominam de “conservadores, e puritanos”, são aqueles que acreditam em moralismo estéril e ainda não compreenderam a fecundidade positiva da parábola dos talentos, da parábola do semeador e dos anúncios sempre exigente, humanista e misericordiosa das bem-aventuranças.

Francisco é um humanista. Sensível ao clamor dos pobres e dos marginalizados, é ante de tudo um “bom samaritano” em tempo de intolerância global. Ele reflete a constante preocupação sobre temas sensíveis a tradição da Doutrinas Social da Igreja Católica (DSI) pela exigência implicadas na justiça social que deve estar em continua atualização e orientada a serviço da pessoa humana e, de maneira particular, para aqueles que estão marginalizados pela sociedade neoliberal e capitalista, e que, são vítimas diretas da pobreza e a exclusão social. Em seu pontificado, o Papa argentino, busca identificar as causas e combate-las: em primeiro lugar, trata da pobreza material, da fome e da privação externa incluindo o trabalho escravo, os imigrantes, o desemprego, o drama dos refugiados e da perda das famílias.  Em segundo lugar, busca identificar as raízes da pobreza, da exclusão e da violência contra os pobres. Francisco não vive de luxos e status, ele deseja viver na solidariedade concreta dos injustiçados.

O sucessor de Pedro, busca atingir o coração ideológico do sistema dominante: “Não podemos confiar nas forças cegas e na mão invisível do mercado” (Evangelii Gaudium, 204), afirma. Para Francisco a lógica do mercado quando se resume ao lucro, a dignidade humana desaparece, o humano não pode ser quantificado por valores monetários. Por isso, ressalta, que a mercantilização de tudo transforma a sociedade em uma sociedade de mercado que perverte a dimensão política do ser humano, a dimensão mais profunda que significa viver em uma sociedade com direitos, deveres e obrigações. Segundo o teólogo Elio Estanilau Gasda “A posição decidida de Francisco por um modelo econômico que tenha como centro a pessoa está na base de sua crítica contundente ao modelo vigente. Seu objetivo é pôr fim ao histórico divórcio entre ética e economia, reconhecendo a imoralidade da atividade econômica quando esta se reduz unicamente à ideia de que negócio é negócio”. Nenhum modelo econômico pode substituir a dignidade humana.

A caraterística mais profunda e determinante da Doutrina Social da Igreja Católica retomada por Francisco em seu pontificado é aquele vinculo indissociável entre a fé e os pobres.  A “opção preferencial pelos pobres” é reafirmada com a finalidade de que seja exclusivamente a partir da perspectiva do amor de Jesus pelos últimos, pelos pequeninos e indefensos está no centro e cerne de sua pregação evangélica. É algo que não se reduz a políticas de inclusão social ou a simple política populista seja de ideologia de esquerda ou de direita, mas deve ser uma causa assumido como desafio de todos os cidadãos do mundo. Para Francisco é na figura dos pobres reais, palpável e visível como o desempregado, o morador de rua, o doente, a mulher vitima de violência, as crianças abandonadas, as vítimas dos diversos tipos de intolerância, sejam elas vítimas de homofobia, vítimas de racismo ou de intolerância religiosa, eles devem ocupar na origem do conceito de ecologia integral e por isso é preciso ver nessas vítimas a presença de Jesus crucificado, ajuda-los, ampara-lo, protege-lo como o bom samaritano. É nesse quadro geral, que é necessário e urgente inserir a Doutrina Social da Igreja Católica, resgatando o valor originário do anuncio da boa notícia do evangelho que tem seu coração no Deus revelado em Jesus, o Deus do Amor fraterno, da vida e da justiça com os pobres da terra. Deus é encarnado em Jesus pobre-crucificado em solidariedade com os pobres, para nos salvar e nos libertar de todo mal, pecado, morte e injustiça.

Caro leitor, finalmente, quero compartilhar com vocês, as palavras proféticas proferidas pelo Papa Francisco, em ocasião do II Encontro Mundial dos Movimentos Populares, realizados na Bolívia em 2015: “Quem governa então? O dinheiro. Como governa? Com o chicote do medo, da desigualdade, da violência econômica, social, cultural e militar que gera sempre mais violência em uma espiral descendente que parece nunca acabar”. Nesta mesma direção, o Papa Latino-americano já tinha lembrado no início do seu pontificado: “Quantas palavras se tornaram molestas para este sistema! Molesta que se fale de ética, molesta que se fale de solidariedade mundial, molesta que se fale de distribuição de bens, molesta que se fale de defender os postos de trabalho, molesta que se fale de dignidade dos fracos, molesta que se fale de um Deus que exige um compromisso em prol da justiça” (Evangelii Gaudium, 2013).

A odisseia profética de Francisco está em pleno desenvolvimentos. A divulgação do documento final do Sínodo da Amazônia é aguardada por uma parcela do povo católico com expetativa evangélica, já que, desejam uma Igreja em diálogo com o mundo contemporâneo, por outro lado, os conservadores e fundamentalistas continuam no seu intento de boicotar, difamar e perseguir com todas as forças e armas possíveis o pontificado de Francisco.

* Daniel Andrés Baez Brizueña é formado em Teologia, Ciencia das religiões, Marketing, Letras e Filosofia.

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